Sou Grata
Ana Costa Ana Costa
Nem sei bem como começar...
Foram 14 anos de TAP.
17 anos de Assistente de Bordo, a profissão que sempre quis, que sempre sonhei, por tanto que lutei.
A minha "saga" começa em 2001, quando concorri para uma companhia que seria nova no mercado, com 51% de participação da Tap, a Yes. Viria a ser uma companhia charter, mas e porque na altura, todo o processo foi feito em cima do joelho, ou seja à pressa, já tinha iniciado o curso, há mais de 1 mês quando fui chamada à UCS para me dizerem que tinha sido dada como inapta com um problema no coração. Faltavam 2 semanas para terminar o curso e ir a exame final, não desisti, acabei o curso e fiz tudo o que estava nas minhas mãos para perceber o que se passava, tinha 25 anos, e como é de calcular, o coração quase me saltava pela boca, com medo de um diagnóstico e do que estava ali em causa.
Fiz um ecocardiograma com dopler, electrocardiograma, e fiquei a saber que o prolapso da válvula mitral que me tinha sido diagnosticado na UCS, não passava de um sopro, comum a mais de 90% da população feminina e que pode ter maior expressão durante o período da mestruação. Ou seja, nada que impedisse de forma directa o desempenho da função de Assistente de Bordo.
Insisti para que os meus exames médicos realizados fora fossem aceites e tidos em consideração, mas não.
Não aceitaram uma opinião médica de outro médico que não da UCS.
O tempo passou, e entretanto entre 2001 e 2003 continuei e terminei a minha Licenciatura em Investigação Social Aplicada.
Como o sonho comanda a Vida, em Março de 2003 tive conhecimento da abertura de concurso para a Euroatlantic e tentei a minha sorte.
Fui aceite, fiz o curso, mas sabia à partida que não iria ser chamada, afinal já tinha "passado" pela "concorrência" a Yes, mesmo que nunca tenha iniciado o voo, mas na aviação é assim, as rivalidades são tantas que são os candidatos que acabam por sofrer, se bem que a instrutura, diga-se em bom português, sofria era de uma valente dor de corno, e eu apanhei por tabela :)
Mas não esmoreci. Disseram-me que ia abrir uma vaga na YES, e assim foi, candidatei-me e acabei por ser aceite, naquela que tinha sido a minha primeira abordagem na aviação, mas desta vez, e com apresentação de um relatório médico logo à partida, fui aceite pela UCS.
Foram 3 anos de uma experiência fabulosa, voar numa companhia charter dá-nos uma bagagem e uma experiência que nem sempre se tem nas companhias de bandeira, que é o caso da TAP.
Nunca, nunca desisti, e aos 30 anos(11/2005) soube que a TAP tinha aberto concurso para candidatos com experiência até aos 30 anos e não perdi tempo, era isso ou morrer na praia. Foi um ano muito conturbado para as pequenas companhias, muitas tinham fechado ou dispensado tripulantes, foi mais uma forma de dar oportunidade a mais tripulantes, visto que até esse ano todos os concursos na Tap tinham como limite de idade os 27 anos.
E desta é que foi, entrei na TAP!
Era o meu sonho de menina realizado, e a prova de que a minha persistência tinha valido a pena.
Foram 14 anos desta casa, momentos melhores que os outros, anos mais dificeis do que outros, sobretudo depois de ser mãe em 2009. Custava-me horrores sair de casa e ir.
Na altura estava no longo curso, e a questão do oceano que separa os dois continentes começou a mexer comigo.
Em 2013 pedi para regressar ao médio curso, e a partir daí as coisas começaram a acalmar em termos emocionais.
Fui levando, fui muito feliz e em 2018, chego a Chefe de Cabine.
Somos mais uma vez submetidos a um curso, duro e de muita pressão.
Adorei o curso e a função com Chefe de Cabine, modéstia à parte, assentava-me que nem uma luva. Era muito feliz no desdempenho da função, adorava o trabalho em equipa e neste caso o de liderança, mas sempre com o princípio de delegar, pois só assim se conquista a confiança daqueles que trabalham connosco.
A carga de trabalho aumentava a olhos vistos, cada vez mais voos e menos descanso, menos tempo para nós, família e a saúde a dar sinais.
Comecei por dormir mal, até que deixei mesmo de dormir. Em casa já não tinha paciência para nada e só berrava, como me chegou a dizer o meu filho, e neste caso ele seria o último que deveria ser vítima disto tudo.
Mas a situação tomou proporções assustadoras no fim de semana de 15/16 de Dezembro, quando deixei de sentir os membros superiores. Nunca tive tanto medo.
No dia 17 de Dezembro pedi "ajuda" e a partir desse dia entro de Baixa Médica. O resto já aqui deixei noutro texto. Olá Burnout!
Praticamente 1 ano de Baixa Médica, e mais 4 meses de incapacidade de voo.
E assim o tempo foi passando, pensei muito, ponderei muito, avaliei os prós e os contras, mas cheguei à conclusão que o meu futuro não voltaria a passar pela Aviação. Tenho de cuidar de mim, do meu filho, dos meus pais e depois então penso o que virei a fazer. Para já era obrigatório desvincular-me em consciência.
O dia 14 de Janeiro de 2020, ficará para sempre marcado como o virar de página para um novo capítulo na minha Vida.
A todos os que deixo para trás, mas que sempre me apoiaram, nunca os esquecerei. Passei muito bons momentos, muita garagalhada, muito disparate, mas uma Vida cheia de boas memórias, com pessoas boas que ficam para sempre no meu
Sejam Felizes...
Estarei sempre aqui para todos vós
AC